Lisboa, 7 de Setembro de 1974
Correspondência Pessoal/Devolvido ao Remetente
Joana não faz sentido impedires-me de ir aí.
Se o risco que corro é perder-te para sempre se te procurar, diz-me então o que é que muda se ficar?
O que é que se passa de tão grave? As cartas que remeto aos meus pais são devolvidas com uma enorme cruz sobre os seus nomes, os telegramas que tento enviar não chegam. De Sta. Apolónia dizem-me que o velho apeadeiro de S.Vicente da Lua encerrou, que não há bilhetes de comboio para aí chegar. Que terei que percorrer os 70 quilómetros que separam as Penhas da Saudade de S. Vicente pelo meu próprio pé, entre bosques e florestas. Ainda assim estou disposto a ir, enfrentarei lobos, tempestades, geadas para encurtar a distância entre nós. Mas rogo-te que me respondas, que me dês uma luz de esperança, um sinal por mais ínfimo que seja e eu irei. Viveremos aqui mesmo na Capital, longe do que te atormenta aí. O meu quarto chega para nós.
Vivo ensurdecido com o silêncio que me chega daí. Se a tua resposta não vier dentro deste mês partirei e não há nada, nem ninguém que me impeçam de te resgatar do que quer que seja.
Envio-te estas letras pelo filho dos Alvares que parte hoje mesmo para S.Vicente de boleia com um colega nosso de faculdade.
Do sempre teu
Júlio
Correspondência Pessoal/ Recebida juntamente com o documento anterior
S.Vicente da Lua (data omissa)
Júlio devolvo-te a tua carta, tenho medo que a apanhem. Eles parecem desprovidos de cérebro, mas...(ilegível)... O filho dos Alvares disse que ia tentar chegar às Penhas da Saudade e pedi-lhe que enviasse....(ilegível)... Eles querem matar-nos a todos.... Os teus pais, eles não sobrev...(manchado de substância de cor vermelha)...Ajuda-me a fugir, vem por favor esquece tudo o que te disse e vem... Espero um filho teu, tira-nos daqui... Vou tentar... (ilegível).... Na floresta...
Nota: Prova redigida com o que parece ser sangue de animal, não foi usada tinta.
Há quem goste delas curtas, há quem as aprecie mais longas, mas para nós o tamanho não importa, uma história merece sempre ser contada.
sexta-feira, 23 de outubro de 2009
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5 comentários:
Amor no meio daquilo que parece ser uma enorme violência...
é mesmo teu Ana!!!
Miguel no meio da violência que se instalou existem vidas, histórias...
Agora toca a desconstruir isto tudo e mete o homem a caminho.
Uau!!
Correndo o risco de ser repetitiva: isto está muito bom!
;)
está muito bom Ana C.
e uma história de amor fica sempre bem, especialmente no meio de tanta provação e suspense :)
beijinhos a todos e bom fim de semana
:D que belíssima blogonovela!!!
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