João aperta o passo em ziguezague, fintando aquela gentinha anónima de aeroporto. Foda-se para isto, pensa, posso estar em Banguecoque ou em La Paz, gentalha de aeroporto é tudo a mesma coisa, carinhas bovinas a olhar painéis. Não se deixa irritar muito desta vez, ora porque o Xanax que usou para acalmar a taquicardia ainda canta, ora porque não pode perder o rasto à morena que o interpelou no voo. É incrivelmente parecida com o seu alvo, mas como seria isso possível? Acorda, João, Não seria. Merda do ar dos aviões, até alucinações dão.
O telemóvel toca. Leonor. Leonor e os seus timings perfeitos.
- Leonor, estou a caminho de uma reunião importante, podias deixar isso para...
- A Leonor está bem.
João não reconhece a voz àquele homem, mas sabe exactamente quem é.
Sérgio Andrade. Seja esse o nome de uma pessoa ou uma organização.
- Vai-me dizer o que devo fazer para ela continuar bem, não é?
- O mesmo humor de sempre, João.
Ok, já estamos a fazer progressos. É alguém do passado.
- A mulher do avião? Esquece-a.
- Então é mesmo a tal...
- É mesmo a tal de quem a vida da tua mulher depende. É a tal que te tem pelos tomates, portanto. Esquece-a.
João olha para um lado, olha para o outro. Não sabe da mulher do avião.
- Não será difícil, já a perdi.
- Os vossos caminhos vão voltar-se a cruzar. E tu, João, vais-te desviar dela.
João tem um ar de riso. Claro que não era só um quadro.
- Como é que sei que não clonaram o telefone da Leonor? Quero uma prova!
- Sempre soubeste identificar bluffs, João.
João suspira. É verdade.
- Quando tivermos o Modigliani, terás a tua mulher.
Desligam.
O quadro, outra vez. Seja o que for, aquela mulher e aquele quadro parecem ser duas faces da mesma moeda. Do mesmo conceito.
E, de repente, Ana reaparece. Tem agora uma maleta preta e dirige-se à porta de saída. João caminha em passos firmes sem desviar o olhar. Ela passa a porta giratória. Segundos depois, ele também. Quase tropeça num mendigo que está ali sentado com um pratinho de moedas.
E lá, encostada ao Mercedes preto, está outra Ana. Vestida exactamente com o mesmo tailleur escuro.
João esfrega os olhos.
A Ana do avião cumprimenta a outra com um beijo demorado nos lábios. A porta do condutor abre-se e sai de lá outra mulher.
Outra Ana. Idêntica.
Trigémeas.
Depois dos cumprimentos rápidos, entram as três no carro e partem.
João está atónito.
Qual delas será o seu alvo? Se falhar, é banido do "Banco". Se for bem sucedido, perde Leonor.
Precisa de beber um café para aplacar o efeito do Xanax e pensar em tudo isso. Ao passar pela porta giratória, sente uma mão a agarrar-lhe o tornozelo. É o mendigo.
- Quoi qu’il arrive... Ne te laisse pas influencer par la première image.
João olha-o. Mas que diabo...
- Quelle image?
- Pense deux fois.
O mendigo larga-o. Pela primeira vez em anos de profissão, João sente-se encurralado.
Há quem goste delas curtas, há quem as aprecie mais longas, mas para nós o tamanho não importa, uma história merece sempre ser contada.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
7 comentários:
Mas What The Fuck? Se o teu objectivo era enfiar os nossos miolos pensantes na centrifugadora, PARABÉNS!!!!! 3 ANAS?
Já sei qual foi o teu mal. Ontem teres visto o Professor Langdon...
O mais incrível no meio de tudo isto é termos todos maneiras de escrever totalmente diferentes. Estou a adorar!!!!!
Que nada, problemazinho simples. Só tem de identificar qual é a gaja para depois decidir se a mata e fica no Banco ou se a deixa ir e fica com a mulher.
Bah, em qualquer divã se resolve esse dilema. :P
Palminhas para a Melissinha!!
;)
Mas tu e a Ana C. estudaram no mesmo curso ou quê??? Já não bastava uma a criar situações impossíveis...
;)
Foi muito bem esgalhado!! Parabéns!! Quanto a ser um dilema simples de resolver: não te esqueças que, qualquer que seja a linha narrativa que tenhas em mente ela vai ser completamente destruída por um dos outros autores!!!
Mas logo vês...
Clementine, c'est a toi l'histoire...
Bonito, Bonito e eu é que me lixo! Nao é...grande desafio...o primeiro hein e logo com este berbicacho entre mãos!
obrigado Melissinha, isto sim foi passar a batata quente com grande categoria!!!
Não se deixem influenciar pela primeira imagem... MUHAHAHAHA!!!
Vários dias sem vir aqui e isto fica numa animação que só visto!! ;)
Gostei das 3 Anas! Há uns anos li uma BD que era a Histórias das 3 Anas, uma era a Ana Mar, as outras não me lembro, mas gostei muito do livro era de autor Português, mas tb já não me lembro o nome...
Boa reviravolta, Melissa!
Enviar um comentário