Enquanto os lábios de “Marie” exploravam o interior da sua boca, pequenos alertas começaram a soar dentro de si. Os velhos sinais que sempre o haviam protegido em cenário de guerra e tantas vezes nas suas missões enquanto assassino a soldo, soavam agora mais fortes do que nunca, retesando-lhe os músculos, colocando-o num estado de hiper vigilância e num impulso que não conseguiu conter, afastou de si a mulher que tentava seduzi-lo, levantando-se com uma violência tal que a projectou a ela e à própria mesa pelos ares. Mas estranhamente não ouviu o ruído das garrafas a quebrarem-se, nem tão pouco sentiu o cheiro do vinho derramado.
O olhar turvo, a boca seca, a cabeça tonta indicavam-lhe que não estava no controle da situação e isso tirava-o do sério. Queria correr dali para fora, mas as pernas estavam presas, queria gritar, mas apenas um leve murmúrio se soltava da garganta enfraquecida. Esfregou os olhos raiados de sangue e quando voltou a abri-los já não estava lá ninguém. Encontrava-se sozinho na sala privada do restaurante. A mesa não estava caída no chão, não havia garrafas entornadas, nem o ruído das vozes femininas povoava o ar em seu redor, cada vez mais escasso. Sentia-se sufocar.
Queria juntar as peças do puzzle, raciocinar com clareza, mas antes de conseguir perceber o que lhe estava a acontecer caiu sem sentidos, inanimado no chão pegajoso do restaurante. O seu cérebro gritava ordens de comando ao corpo entorpecido, mas os músculos não lhe obedeciam.
Ouviu uma voz feminina suave que cuspia ordens de maneira firme e segura e sentiu quatro mãos que pegavam no seu corpo inerte, elevando-o no ar. O frio da rua penetrou nos seus pulmões como uma facada e o motor de um carro em funcionamento disse-lhe que alguém aguardava por eles. O som seco de uma mala a fechar catapultou-o para o que julgou ser a sua própria morte. Então morrer era assim? Mas que voz era aquela que continuava a escutar? Que ruído de fundo, que mãos lhe tocavam agora? Só podia ser uma qualquer entidade divina encarregue de o transportar nos braços até ao juízo final.
O som de uma peça para piano de Mozart puxou-o do sono profundo em que havia caído e quando conseguiu finalmente descerrar o olhar e despertar do que lhe parecera o seu próprio fim, uma mulher fitava-o. Cabelos cor de mel, olhar perdido no fundo da alma. Um olhar escuro, cheio de todos os mistérios femininos do mundo. Num flash cada vez mais consciente sentiu a mão de Ana no avião quando passou por ele e reviu na sua mente tudo o que tinha acontecido. O seu olhar demasiado treinado para se deixar enganar lembrou então a subtileza com que o alvo do seu próximo crime passara a mão sobre o seu copo de Whisky pousado na mesinha de refeição.
Mas antes de poder alinhavar as suas próprias conclusões olhou de volta o olhar que o fitava vindo de uma simples pintura e percebeu que estava na presença do famoso Modigliani. A mulher retratada pelo pintor que morrera na miséria estava no mesmo compartimento que ele, desafiando-o, tentando-o, mas ao mesmo tempo, enchendo-o da mais profunda paz. Quem quer que fosse aquela mulher ali pintada valia a pena lutar por ela, disso não restava a menor dúvida.
- A minha bisavó Francesca e antes que me pergunte sim. Fui eu que o dopei no avião.
João virou-se naquela cama improvisada sobre um sofá de veludo e ali estava ela mais uma vez, a mulher que teria que assassinar. Bonita, quase etérea, num olhar em tudo tão semelhante ao do quadro.
Há quem goste delas curtas, há quem as aprecie mais longas, mas para nós o tamanho não importa, uma história merece sempre ser contada.
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6 comentários:
Beeeem! Muito bem! E ainda bem que já não sou eu que sigo as tuas deixas!!
;)
Concordo com o Miguel...ufffaa já me escapei...mas acho que não me vou escapar das da Melissinha!! ;)
Gostei!
Miguel a história das 3 mulheres só podia ser uma alucinação ;)
Confessa que já sentes saudades de agarrar nas minhas deixas.
Para a próxima história rodamos.
Clementine espero que a Melissa te cozinhe uma bota bastante dificil de descalçar. Assim é que tem piada ;)
Ana, bem no fundo de mim esperava que continuasses a descrição do sexo a três. Mas já conheço a tua forma de escrever bem demais para realmente acreditar nisso!!! Sabia que ias arranjar maneira de te safar dessa!
Melissa... aguardamos!
Ana, sim é verdade as botas dificeis é que são boas...! Vou estar ausente no fim de semana por isso melissinha sinta-se à vontade para demorar ;)
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