Há quem goste delas curtas, há quem as aprecie mais longas, mas para nós o tamanho não importa, uma história merece sempre ser contada.

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Resolução para 2010.

Acabar a saga "O Inverno e a Aldeia" e se possível escrever aí mais uma historieta. Ou duas, vá...

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Queridos Amigos

Queridos amigos, colegas de escrita e eu própria
O que é que se passa connosco?
Possuídos pelo espírito que tomou conta de S.Vicente da Lua, ou simplesmente cansados e engolidos pela rotina que nos arranca a inspiração?
Aguardo melhores dias para todos.
A vossa estimada, maravilhosa, sensual e carismática
Anacê
Cascais, 22 de Dezembro do ano de 2009

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

O Inverno e a Aldeia 26

- A esta hora Sr. Prior?
Os olhos de Joana brilhavam de surpresa.
- Como me disseste que os ruídos chegavam ao anoitecer decidi vir, para que não os escutasses sozinha. Juntos vamos perceber o que se passa realmente, que ruídos são esses à beira da tua casa.
Joana não sabia se havia de rir, ou chorar de agradecimento. O Prior levou a mão ao bolso, acariciando a pequena adaga que trouxera da capela que abraçava o rosário meio escondido nessa parte da batina.
- Tem sido tão bom para mim…
- Porque é que não desligas as lamparinas? Quem quer que venha não tem que nos ver aqui dentro a espreitar a janela.
- Claro, claro. Eu nunca espreitei, pois morro de medo de ver alguma coisa que não quero. No fundo, no fundo, por pura falta de coragem.
As palmas das mãos de Alberto estavam húmidas de pânico. Sabia que aquelas alucinações eram a prova viva que Joana estava possessa, que residia nela o mal de todo S. Vicente da Lua. Ele sabia-o bem dentro de si, mas por outro lado quando a via assim, desprovida de chagas, de rubores, de malícia, sentia que estava perante a mulher mais pura da aldeia. Pureza de alma. Enquanto a via desligar as lamparinas com uma fé cega no seu conselho desejava estar errado, desejava ouvir realmente as cantilenas que ela dizia escutar. Rezou com fervor para que começassem os gritos no escuro, as velas acesas lá fora, pois assim não teria que usar aquela adaga que lhe ardia como fogo entre os dedos.
Ao longe, abrigado do frio por uma grossa samarra de lã grossa, Júlio olhou mais uma vez a casa onde o esperava o filho e tremeu quando viu a fraca luz que a iluminava apagar-se, deixando tudo em seu redor envolto na mais completa bruma. Estugou o passo da burra e sentiu que a sua própria vida dependeria da velocidade a que conseguisse alcançar a aldeia.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

O Inverno e a Aldeia.

Ao meu amado filho, ainda por nascer.
Meu filho, após uma longa e solitária viagem de três dias, a pé por entre os montes e as matas que os habitam, eis que me encontro na serra sobranceira a S. Vicente. Quero genuinamente sentir-me feliz, alegre e revigorado pela visão da minha terra, da nossa terra, aquela onde conheci a tua mãe e onde foste concebido mas não sinto nada. Nada. Será talvez porque, na verdade, não vejo o casario? Todas as casas, desde as mais próximas aos campos até às ladeiras à Igreja estão perdidas no meio do nevoeiro cerrado. Só se vê a torre da Igreja, como se o Senhor estivesse a assistir, impávido e sereno, ao que acontece dentro do negrume. Será possível que Deus nos tenha abandonado?
Nem sei porquê esta interrogação que me invade. Mas sinto-me vazio, frio, gelado por dentro. O meu coração, que me encheu de força para encontrar o meu filho, está agora parado. Que coisa é esta que me invade? Onde foi a alegria que trouxe até aqui? E porque não sou capaz de entrar na minha terra, no pedaço de mundo que viu nascer? O silêncio está por todo o lado. Não se ouve nada. Nem pessoas, nem os cães, nem os mugidos das vacas e os seus badalos, nem o sino da Igreja, nem as crianças a correr pelo empedrado das ruas, nem os pássaros a piar ao final da tarde. Mas o que mais me impressiona é esta indiferença ao facto de estar a pouca distância de ti, meu filho. A minha mente é constantemente invadida por imagens de dor e sofrimento. Não que tu estejas a sofrer mas que... sejas tu o causador do desespero. Vejo imagens de um homem, adulto, que ri enquanto bate e humilha outros homens e mulheres. Ele ri e eu oiço o seu riso, o seu gargalhar ecoa na minha cabeça e eu sei, eu sei que esse homem é o meu filho. Esse homem serás tu.
Mas que pai serei eu, que homem cria o seu filho para que ele se torne no canalha que me invade a mente? Onde se esconderão os meus erros? Falho na minha missão de pai mesmo antes do teu nascimento, meu filho. Perdoa-me, se puderes. E este maldito vento que se faz sentir no monte onde me encontro. Maldito que vem das partes do nevoeiro e parece trazer as preces da gente da terra, as mesmas preces que se ouvem nos funerais, lentas, murmuradas que parecem empurrar o morto para além dos sete palmos da cova que lhe talharam. Sempre me arrepiou esse lamurio das carpideiras que fazem da dor dos outros o seu entretém nas noites passadas sentadas nos frios bancos de pedra da casa mortuária da Igreja, enquanto ensaiam choros fingidos e gritos de dor. Cada uma na sua vez, encadeadas como num coro. São esses os sons que trás o vento, meu filho. E, como sempre, a minha pele arrepia-se de angústia.
A noite cai. É hora de me preparar para a caminhada que me levará a sentir-te na barriga da tua mãe. E é curioso que seja a noite a trazer-me uma alegria. Vejo ao longe uma luz, no meio do nevoeiro! Uma luz que parece ténue mas que deve ser forte, para conseguir trespassar o espectro negro que rodeia a aldeia. Uma luz que ondula, como as árvores ao vento, como se estivesse a assinalar onde tu estás, meu filho. Conheço bem a aldeia, e ali, de onde a luz parece chamar-me é a casa da tua mãe, Joana. Bem perto fica a torre da Igreja, solene, alta, distante. Dela só me chega angústia.
Se eu perecer, rogo a quem encontrar a minha velha carcaça que entregue esta carta ao meu filho, o filho de Júlio e Joana de S. Vicente da Lua.
Este episódio é dedicado à Nuvem. Pela sua incansável fidelidade, obrigado!
(Já podes ir falar com o Pai Natal!)