Há quem goste delas curtas, há quem as aprecie mais longas, mas para nós o tamanho não importa, uma história merece sempre ser contada.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Do outro lado da mira: Ana.

Baixou-se calmamente e apanhou o envelope. Olhou para Leonor que ficou muda. A sua pele estava ainda mais branca do que era o normal, o olhar perdido mas com laivos de desafio. Sem nada dizer, João colocou o envelope na sua gaveta original, fechou-a e retirou a chave. Leonor sentia a dureza do seu olhar enquanto colocava a gravata, vestia o casaco e se retirava. Estremeceu com o bater da porta, bater esse que a fez estremecer e sair do transe em que estava mergulhada.
João entrou no seu carro preto, descaracterizado, de vidros fumados e sem sinais particularmente distintivos. Ligou o sistema de comunicações do carro e ouviu-se o sinal de um telefone que tocava algures. Do outro lado uma voz feminina, intensa e cheia de personalidade, respondeu: "João, meu querido!! Muitos parabéns, a ultima missão foi um sucesso! O cliente ficou muito satisfeito. Mais uma vez encontrarás os teus honorários na conta designada. Está tudo bem contigo?" Esta última frase vinha cheia de segundas intenções, levemente provocadora.
"Deixe-se de tretas Chefe... recebi a foto do próximo alvo. Uma mulher? Não é muito comum... qual é a história?"
"Ah... sim! Ana... Ana Casaco. É uma especialista e coleccionadora de arte, principalmente quadros. O nosso cliente deseja uma peça que está na sua posse mas ela está renitente. Uma obra de Modigliani... mas enfim, não interessa. O que interessa é que o nosso cliente não está nada satisfeito com o comportamento dessa senhora e deseja que ela desapareça."
"Assim? Quer vê-la morta por causa de um quadro??"
"Bom... esse quadro vale muito dinheiro e o nosso cliente gosta de dinheiro..."
"Não quero saber. As coisas estão prontas?"
"Encontrarás tudo o que precisas no banco. Quando foi a última vez que estiveste em Paris?"
"Adeus." João desligou o telefone.
Estacionou o carro em frente ao Banco. Um empregado levou o carro para as entranhas do prédio. Era um prédio enorme, secular, na baixa, rodeado de monumentos. Tinha um ar austero e inacessível mas estava impecavelmente limpo o que o destacava do negrume dos prédios públicos que o rodeavam. A entrada imponente dava acesso a um enorme átrio com um chão de mármore imaculado mas vazio. Os passos ecoavam pelo espaço percorrendo as enormes colunas trabalhadas até ficarem aprisionados nas abóbadas do tecto decorado com pinturas de temas renascentistas. Ao fundo, um empregado fardado com um uniforme carmesim recebeu João com um caloroso "Bom dia Dr.!" a que ele respondeu com um sorriso e um ligeiro aceno com a cabeça. Entrou no elevador e saiu no último andar, um andar de acesso restrito onde só ele trabalhava. Tirou o casaco e desapertou a gravata. Em cima da secretária um envelope. Saiu para o enorme terraço e sentou-se á mesa enquanto um empregado lhe trazia o seu pequeno almoço. Esperou que ele saísse e abriu o envelope. Um bilhete de avião para o aeroporto Charles de Gaulle, só de ida, um passaporte e uma foto de Ana. A sua missão estava lançada mas uma coisa o intrigava: quem era Sérgio Andrade? A agência não encontrara nada acerca deste nome.

4 comentários:

Ana C. disse...

Ana Casaco?!!! Vieste trazer-me à memória os anos de escola em que o gozo com o meu apelido passava por Ana Casaco, Ana Kispo, Ana Gabardine. Muito obrigada pelas memórias.
Gostei do quadro do Modigliani essa Ana Casaco tem bom gosto :)
Agora este João é um poço de mistérios charmoso.

Miguel disse...

E ter levado a acção para Paris? Um pouco pretencioso não achas?
;)

Ana C. disse...

Teres levado a acção para Paris? Ah Ah que grande ingénuo, quem te disse que não dou a volta ao texto e levo a acção para a Brandoa?

Miguel disse...

Realmente... sou mesmo ingénuo!! De ti pode esperar-se tudo, em termos de narrativa!!